Apanhando – literalmente – na meditação zazen

Soji-ji

Com o objetivo de ter o máximo possível de experiências para entender a cultura japonesa, fui fazer uma meditação zazen. Fui… mas andando para trás pois minha relação com a meditação nunca foi muito boa. Já usei palavras como frustração, desespero e até mesmo tortura para descrever aqueles benditos 5 minutos de meditação pós yoga. Sou aquela pessoa que insulta o instrutor mentalmente (durante 5 minutos, é muito tempo, são muitos insultos), quando ele diz com sua voz de santa lesma zen ” agora esvazie sua mente”. Neste exato momento todas as gavetas do meu inconsciente se abrem e jorros de palavras são projetados delas.

Quando me dizem para esvaziar eu encho. Quando me dizem para me acalmar fico histérica. Quando me dizem para não chorar, abro o bocão. Lembro que, com uns 5 ou 6 anos, meu choro era seguido do famoso “pára de chorar”. O que  me fazia chorar mais e me valeu o apelido de Maria chorona.

Trauma de infância ou não, espirito de contradição ou não, sei que é impossível – para mim pelo menos – esvaziar a tal da mente. Essa aí, não me obedece muito. Enfim, nada vale uma experiência, decidi tentar de qualquer jeito.

Desta vez, não estava sozinha, e agradeci ter ido com amigas. Fomos num templo budista chamado Soji-ji que fica em Tsurumi, não muito longe de Yokohama. Primeiro, nos levaram até a sala de meditação, que é chamada dojo. Minha mente desobediente fez a seguinte equação:

dojo = donjon

(Donjon significa masmorra em francês. Glups.)

Seguida dessa outra equação:

5 minutos de meditação pós yoga = tortura

Antes de começarmos a meditar, um monge nos explicou o que devíamos fazer. Ele disse que íamos meditar por 30 minutos.

Trinta longos minutos minha gente.

Depois ele descreveu a posição na qual devíamos nos instalar, as saudações que devíamos fazer, nos mostrou como era para sentar no zafu (almofada redonda, ver foto acima), a posição da mão/coluna/cabeça, enfim, nos explicou que za significa sentado ou seja zazen é uma meditação sentada onde mente e corpo estão conectados.

Mas eu só escutei: bla bla bla trinta minutos bla bla bla trinta minutos blablabla trinta minutos…

Bla bla bla os olhos tinham que ficar abertos e não tínhamos que esvaziar a mente. Ponto para eles! Não tínhamos que esvaziar a mente! Eureka! Adotei todos os monges que ali estavam na hora. Virei zen. Amei ao próximo! Que libertação! O monge disse que tínhamos que olhar a parede na nossa frente e deixar os pensamentos passar como nuvens no céu. Só isso, simples.

Estava feliz.

Durou pouco.

Durou muito pouco pois apareceu então um monge com algo na mão para nos castigar caso a meditação não fosse feita direito. Não era bem uma vara ou um açoite, era parecido com um bastão mas não era redondo. Estava mais para uma pá de fazer polenta bem comprida.

Dojo = donjon = masmorra

Meu prato estava feito: estava entrando numa masmorra para ser torturada por monges zen que possuíam objetos de tortura! E estava pagando para isso. Sim, você paga para ver, literalmente. Caso você feche os olhos, dê uma cochiladinha, ou sei lá o quê, você se coloca numa posição que indica ao açoitador que você merece o seu castigo. Dai ele vem por trás de você e zaz! Te bate.

Portanto, minha meditação se resumiu a isso:

Nunca vou conseguir ficar 30 minutos nessa posição. Nunca vou conseguir ficar 30 minutos nessa posição. Nunca vou conseguir ficar 30 minutos nessa posição.

Nossa, quase fechei os olhos. Não posso fechar os olhos. Fechei os olhos. Ele vai me bater. Ele vai me bater. Ele vai me bater. Abra os olhos. Marcela, abra já os olhos.

Iiiiiiiiiiiiiii, bateu na minha amiga. Que vontade de rir. Não posso rir. Vou dar gargalhadas. Ele vai ver que quero rir. Ele vai me bater. Ele vai me bater. Ele vai me bater. Pára de sorrir Marcela.

Vou me concentrar na parede. A parede é marrom. Mas os tons de marrom são diferentes. Deviam limpar essa parede, ela está meio suja. Quando pintaram pela última vez? A tinta está meio desgastada. O que é isso? É a sombra do monge na parede! A sombra do açoite. Ele está atrás de mim. Ele vai me bater. Ele vai me bater. Ele vai me bater.

Enfim, meu pé dormiu, parei de sentir minha perna, o sino tocou, a luz acendeu, o açoite foi guardado.

Senti saudades da yoga.

Publicado por

Marcela Meirelles

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